domingo, 26 de abril de 2015

Aranhas mascaradas

É incrível como algumas vezes a natureza pode surpreender por seu compasso tão preciso com a cultura. Ou seria o contrário? Enfim...
Digo isso, pois há algum tempo eu descobri as pequenas aranhas do gênero Maratus e fiquei fascinado por elas. Vulgarmente chamadas de Peacocks spiders (aranhas-pavão), esse gênero de aranhas saltitantes foi descrito já há bastante tempo, em 1878 por Ferdinand Anton Franz Karsch, um entomologista e aracnologista alemão. Porém, somente na década de 1950 as primeiras espécies do gênero foram descritas de forma mais consistente por Dunn (1957). Todas elas presentes na Austrália.
O gênero Maratus apresenta aproximadamente 30 espécies de aranhas descritas até o momento. Elas são pequenas (machos têm entre 2 e 8 mm) e apresentam uma grande capacidade de saltar (estão na família Salticidae), mas com certeza essas não são as características mais fantásticas que elas apresentam. Se você tem pavor de aranhas, fique tranquilo! Talvez depois de conhecer as Peacock spiders você se cure definitivamente e isso por diversas razões.
 
 
Preparem-se! Aqui eu faço um grande parênteses e lanço um salto gigantesco como uma Peacock Spider para deixá-los ainda mais curiosos, para escrever um pouco sobre as máscaras! A relação entre o ser humano e as máscaras é muito longa. Existem exemplares de máscaras antropomórficas encontradas na região do Oriente Médio com mais de 9 mil anos! Com variados usos na história, as máscaras sempre trazem uma relação com a possibilidade de exercitar a imaginação e o simbolismo. De adentrar em um universo oculto e inacessível pela experiência cotidiana com o mundo e com os outros. Octávio Paz, poeta e intelectual mexicano, diz que “Enquanto estamos vivos, não podemos escapar de máscaras e nomes. Somos inseparáveis de nossas ficções – nossas feições”. O fato é que a pluralidade do uso das máscaras em diferentes épocas e em distintas sociedades remete ao caráter transformatório que elas evocam. Sejam elas usadas para rituais religiosos, mágicos, artísticos, lúdicos, etc...
Podemos dizer que praticamente todas as culturas humanas apresentam, em algum aspecto uma relação com o mascaramento. Porém, não vou me aprofundar nessa questão muito interessante por sinal, mas somente enfatizar um pouco sobre as máscaras rituais utilizadas por alguns grupos étnicos na Oceania.
 
Para diversas sociedades nativas, a violência da natureza e as doenças súbitas, por exemplo, são as forças que precisam ser apaziguadas e elas se misturam nas mentes nativas com ideias sobrenaturais. O céu e deus, a chuva e divindades são diferentes aspectos da mesma coisa. Para apaziguar esses deuses é que são realizados rituais são realizados. Ou seja, as cerimônias são um aspecto essencial de suas vidas. Uma saída espetacular para emoções intensas. Nas cerimônias, as máscaras são apetrechos fundamentais e estes objetos refletem a preocupação dos nativos com o dramático. Eles infundem em um objeto atemorizante seu próprio sentimento de terror e sua inadequação em face das forças naturais. É uma aparição quimérica tornada real por meio da arte.
Abaixo segue uma relação imagética de diversas máscaras rituais de diferentes grupos étnicos Polinésios, além de um vídeo mostrando um ritual que utiliza as máscaras.
 
Máscara Tatanua. Nova Irlanda. Madeira, casca, cal e fibras.
Essa máscara era usada em cerimônias funerais chamadas de Malagan.
Para as pessoas Abelam, muitos aspectos da vida giram em torno do cultivo de inhames, cerimônias e festivais associados. As máscaras são parte integrante desses eventos. Esta máscara tumbuan era parte de um traje completa de dança e provavelmente foi usada em um festival de inhame quando coletada durante uma expedição do Museu Australiano em 1964 no  Rio Sepik. Bastão de junco e pigmentos naturais.

Enquanto alguns tipos de máscara eram sagrados, outros, como essa máscara eharo, foram criados principalmente para diversão. Para o povo Elema, os eharo eram "MAEA morava eharu" ("coisas de alegria"), e se dançavam como um prelúdio para rituais mais sagrados. Eharo representam seres sobrenaturais, bem como figuras humorísticas. Material:casca deárvore,  junco revestido e pintado. Metropolitan Museum of Art. 1972.

Esta máscara de dança foi usado por um jovem durante uma cerimônia de iniciação de adultos (kaiva kuku). Tais máscaras foram geralmente queimado após a cerimônia.
Máscara de forma cónica; branca. 1913. Cabeça antropomórfica com olhos proeminentes e boca aberta; parte detrás da cabeça decorada com um círculo vermelho. dois braços salientes nos lados, dobrados nos cotovelos, com as mãos de cinco dedos. Museu Australiano.

Representantes dos Elema utilizando asmáscaras Hevehe e caminhando em direção à casa Eravo. Essa casa era usada somente pelos hmens para discussões políticas e rituais. Baia Orokolo, Papua Nova Guiné.
 
Dança do Fogo no Festival de Máscaras em Rabaul, Papua Nova Guiné.
 
Maratus madelineae macho. Foto de Jürgen C. Otto.
Finalmente agora podemos voltar às aranhas Ufffff, quase esqueci delas nessa viagem toda com máscaras e aranhas? Para tentar relacionar as coisas. Outra característica interessantíssima das aranhas do gênero Maratus, é a morfologia do abdômen (opistossoma) no corpo dos machos. Em quase todas as espécies, os machos apresentam um abdômen extremamente colorido e com padrões de coloração muito intensos. Essas cores são o resultado de escamas iridescentes que refletem a luz (tanto a visível, quanto a luz ultravioleta) e se relacionam com o comportamento de corte realizado pelos machos.
 
 
 
Close na carona da Maratus jactatus evidenciando seus vários
olhinhos e seus palpos peludos. Foto: Jürgen C. Otto.
Outra questão muito interessante é que em nenhuma espécie o padrão de cores dessas escamas se repete. É um padrão único e extremamente sofisticado de cada uma dessas espécies. Em alguns casos são padrões impressionantes! Em um artigo de março de 2015, Jürgen C. Otto, grande entomologista responsável por dar visibilidade às Peacock Spiders, descreve, por exemplo, a Maratus elephans. Uma espécie recém-descoberta e descrita do gênero Maratus. Mas e esse nome... Maratus elephans? Não lembra elefante? Pois então... Nós não estávamos falando de aranhas? Sim.... Estou confuso!
Háááá, não se preocupe. Realmente Maratus elephans refere-se a elefante, como sugere Jürgen em seu artigo:
 
 

O nome específico do grupo (elephans, Latim, a partir do ἐλέφας grego antigo, substantivo em aposição ao nome do gênero, Tradução Português elefante) refere-se à semelhança entre o padrão sobre a lâmina superior do opistossoma de machos adultos desta espécie e a cabeça de um elefante visto de frente.
Olha só o retrato dela:
 
Maratus elephans macho em comportamento de corte. Opistossoma e terceiro par de patas erguidos. Possível visualizar os palpos e alguns de seus olhos de elefante, quer dizer, aranha. Foto: Jürgen C. Otto.
 
Pois bem, no momento em que encontram as fêmeas, os machos levantam seu opistossoma e seu terceiro par de patas e iniciam um comportamento de corte muito interessante com movimentos repetitivos e muito intensos. Em algumas espécies os movimentos são laterais. Em outras envolve giros completos de 360º ao redor do próprio corpo. Existem outras que movimentam também horizontalmente o terceiro par de patas enquanto movem o corpo e o opistossoma. Enfim, é uma grande coreografia extremamente sofisticada com o único e exclusivo objetivo de reproduzir-se. Passar seus genes para a geração seguinte e perpetuar a espécie.
É aqui! Exatamente nesse espaço-tempo que as duas histórias se cruzam: as Peacock Spiders encontram as máscaras! Mas como? Por quê? Onde?
Mais um háááá! Uma das 30 espécies de Peacock, a Maratus speciosus, apresenta uma característica muito interessante. Assim como as outras espécies, seu opistossoma também exibe um padrão único e com escamas iridescentes, porém, seu padrão de coloração assemelha-se muito a uma máscara humana.  Uma máscara antropomórfica. Exatamente como as máscaras usadas nas tradicionais cerimônias e rituais Polinésios.
 
Maratus speciosus. A verdadeira aranha mascarada em ritual de corte. Acaso?
 
No belíssimo vídeo abaixo vocês podem ver a Maratus speciosus em sua dança ritualística típica. A aranha polinésia, mascarada e que traduz em seu corpo os hábitos culturais de diversos grupos étnicos humanos desde há muitos séculos, ou até mesmo milênios.
 

Aqui a biologia encontra a cultura. Encontro inevitável que muitas vezes deixamos passar desapercebido e que se reflete em tudo. Nossas tradições culturais e a diversidade étnica que nos constitui é, continuamente, atravessada pela natureza em suas mais diversas expressões. Aprender a enxergar essa relação é algo que promove uma reconexão necessária com o que em nós é animalidade e persiste e, sempre persistirá.

Referências:

Flickr de Jürgen C. Otto com milhares de fotos das Peacock Spiders: https://www.flickr.com/photos/59431731@N05/

Página do facebook sobre as Peacock Spiders:
https://www.facebook.com/PeacockSpider?ref=ts&fref=ts

Natali Anderson, 2015. Two New Species of Peacock Spiders Discovered in Austrália

OTTO, J; HILL, D. An illustrated review of the known peacock spiders of the genus  Maratus from Australia, with description of a new specie. Peckhamia 96.1, 2011.

OTTO, J; HILL, D. Notes on Maratus Karsch 1878 and related jumping spiders from Australia, with five new species (Araneae: Salticidae: Euophryinae). Peckhamia 103.1, 2012.

OTTO, J; HILL, D. Maratus elephans, a new member of the volans group from New South Wales. Peckhamia 123.1, 2015.

DUNN, R. A.  1957.The Peacock Spider.  Walkabout, 1957.

Sketchs of Maratus

Maratus

Australian Museum: Natural Culture Discover

KAEPPLER, A. Ceremonialmasks: a melanesian art style. JPS, 1963.

The Flourishing os Island Cultures: The Art of Oceania

segunda-feira, 13 de abril de 2015

Vamos de Copinho?

Na segunda fase estamos trabalho com fisiologia do sistema reprodutor, processos reprodutivos, gametogênese, etc...
 
Foi então que lembrei do copinho! Não sou mulher, mas já ouvi várias mulheres falando do "incômodo" que é lidar com o fluxo menstrual durante os terríveis dias em que seus endométrios estão descamando compulsivamente.
 
Aí me deparei em algum lugar com essa publicação:
 
 
E achei bem bacana! Inclusive porque há alguns dias vi o vídeo aí embaixo da JoutJout (pra quem não conhece valeu muito a pena!!! Ela é muito engraçada. Mesmo!) e já tinha pensado em postar pra vocês aqui. Mas a publicação da Bárbara Gondar está bem bacana e no fim de seu artigo ela também usa o vídeo da JoutJout!! Claro que existem os poréns... Para usar o copinho a mulher precisa manter uma higiene constante e tomar cuidado para evitar a possibilidade de infecções, mas certamente me parece uma grande revolução!
 
Espero que gostem e mulheres... Que tal experimentar o tal copinho? Juro que se eu menstruasse eu experimentaria! =]
 
 
 
 

sexta-feira, 10 de abril de 2015

CTNBio aprova comercialização de eucalipto transgênico

Pessoal,
 
Mais uma notícia preocupante e crítica para os rumos ambientais do nosso país...Foi aprovada hoje pela CNTBio (Comissão Técnica Nacional de Biossegurança) a liberação comercial do eucalipto transgênico. Para quem não conhece, o eucalipto é uma árvore exótica, ou seja, não faz parte da nossa flora nativa. Ela é originária da Austrália e começou a ser introduzida no Brasil ainda no século XIX (1848).
 
Reflorestamento de eucalipto em Mogi das Cruzes,SP.
Plantações como essa são chamadas de desertos verdes,
pois embora sejam florestas, não apresentam quase nenhuma
biodiversidade ou capacidade de manutenção ecológica...
 
 
Hoje, o eucalipto é uma das principais monoculturas presentes no Brasil (junto com soja, cana-de-açúcar, milho, pinus...) ocupando uma área de mais de 5 milhões de hectares em franca ampliação, principalmente no Paraná, Rio Grande do Sul, Santa Catarina, São Paulo, Minas Gerais, Espírito Santo e Bahia. A madeira do eucalipto é muito usada para fabricação de papel, indústria moveleira, de construção civil, produção de carvão vegetal, entre outras. Sendo as principais empresas relacionadas ao plantio de Eucalipto a Aracruz Celulose, Suzano Celulose e Arcelor Mittal.
 
Embora a utilização da madeira proveniente do reflorestamento seja necessária, é fato que a forma com que é feito o manejo das áreas plantadas traz inúmeras consequências para a flora e fauna nativa e até mesmo para pequenos produtores rurais.
 
O eucalipto é uma árvore de rápido crescimento e que se for plantada sem os devidos cuidados pode trazer problemas sérios para o ambiente como: erosão, empobrecimento do solo e grande utilização de água.
 
A aprovação da liberação para comercial do eucalipto transgênico é algo extremamente preocupante por diversos motivos. A liberação foi solicitada pela FuturaGene Brasil Tecnologia Ltda, empresa de biotecnologia da Suzano Papel e Celulose. De acordo com nota divulgada pelo órgão, foram 18 votos a favor e 3 contra. A espécie liberada é a Eucalyptus spp L., contendo um gene da planta Arabidopsis thaliana.
 
 
O Brasil é o primeiro país do mundo a liberar o eucalipto geneticamente modificado. Segundo os técnicos da FuturaGene, o eucalipto modificado tem 20% mais de produtividade e poderá ser usado na produção de madeira, papel, entre outros itens. Porém, a que custo? Os estudos realizados para a liberação do plantio do eucalipto ainda são um tanto obscuros... Embora a empresa tenha feito estudos sobre o desenvolvimento dos eucaliptos transgênicos e tentado projetar as consequências de seu uso, é muito difícil supor como ele se comportará no ambiente, pois árvores são organismos que apresentam um ciclo e vida longo (no caso das espécies transgênicas de eucalipto, pelo menos 5 anos....).
 
Enfim, vale dar uma lida nos materiais que deixarei aqui disponíveis para se informar sobre a questão e pensar... quais os reais interesses nessa liberação e a quem realmente isso interessa?